I
Subi ao alto da montanha escura
E lá sentei-me a meditar na vida
Estava entretido, mente distraída
Quando apareceu-me bela criatura
Uma linda jovem de boa estatura
Cabelo azulado, veste bem comprida
Tinha no olhar algo de falecida
Tinha algo místico em tal figura
Veio e entregou-me uma espada afiada
Tintas, uma pena e um grosso borrão
Dizendo: “Escreva versos todo dia”
Eu lhe perguntei o que fazer da espada
Ela me falou: “ Fere o coração,
Pois é só na dor que se faz poesia”.
II
Numa noite fria em que a chuva não passa
Tive uma visão da musa inspiradora
Uma jovem bela, linda, encantadora
Veio em minhas mãos colocar uma taça
Cortou um dos pulsos, sorrindo com graça
E enchendo a taça me ordenou beber
Mal ouvi sua voz já estava a fazer
E o sabor de sangue 'inda agora não passa
Assim que bebi tive várias visões
Vi mundos de sonhos, tantas ilusões
Deuses e demônios, santos e profetas
A jovem me disse: “Escreva tudo isso
À toa o meu sangue eu nunca desperdiço
Tal inspiração eu só dou aos poetas”.
III
Na neblina eu só podia ver um vulto
Na escuridão não conseguia ver seu rosto
Mas a visão ao invés de medo dava gosto:
Quem era aquele que nas trevas vinha oculto?
Chega tão perto que seus passos eu escuto
O que será esta miragem, o que quer?
Percebo seios e os quadris –uma mulher!
Em roupa preta e um capuz, como de luto
Na mão direita traz acesa grossa vela
Cabelo azul, é minha musa, sei que é ela!
Mas de seus lábios não escuto nenhum som
E, de repente, a ouço por telepatia
Me repetindo: “Escreva versos todo dia,
Pois se te dei, posso também tirar-te o dom”.